Na recente solidão do escritório, Andréa quase sorri ao ler o início do e-mail de Mírian:
“Acho que o seu carnaval foi bem mais divertido do que o meu. Tentarei resumir a tragédia, mas não se espante. Ainda bem que carnaval só existe uma vez no ano. Graças a Deus!”
Tragédia?! Será que minha fiel amiga de infância conhecia o real e profundo significado dessa palavra? Mesmo estando desempregada em Fortaleza e morando de favor em casa de amigos, duvidava que ela tivesse razão.
– Alô! – atendeu sonolenta torcendo para ser engano.
– Desculpe tá ligando tão cedo, Ternura!
– Help? É você? – reconheceu imediatamente a voz de sua companheira de aventuras.
– Eu consegui vender minha passagem. Tenta vender a tua! Se bem que no dia da viagem é bem difícil.
– Eu acho lindas essas coisas – ironizou e sorriu. – Como diria o Garfield: essa foi a gota de leite. A lei de Murphy!

Ficou confusa. “E agora, José?” Não queria viajar com um grupo de estranhos, nunca foi uma pessoa sociável. Por outro lado, não suportaria mais um feriadão sozinha no seu minúsculo apartamento. A única maneira de temperar a sua vida insípida seria trocando a monótona Boa Viagem por uns dias longe da rotina entediante. Opções de convite e hospedagem em casa de amigos não faltavam: Glauberto em Viçosa, Tony em Natal, Joseph em Mossoró, Marcelo em Recife, Rose em Caruaru, Bel em Granito, Nega em Petrolina, Sandra em João Pessoa, Biane em Campina Grande, Sarah em Sousa, Welinton em Salvador, Jussara em São Luís, Mírian em Belém, Nunes em Brasília, Adriana em Goiânia, e até, Evelyn em São Paulo.
Teve um dia atarefado na empresa. Às 18h ainda precisava imprimir umas vinte notas fiscais.
– Você não tá com uma cara muito animada, m-e-n-i-n-a. Normalmente, você fica mega-ultra-super-hiper eufórica quando vai viajar.
– Dréa, você não quer ir no meu lugar?
– Pirou, perua? E deixar Viny aqui? Livre, leve e solto em pleno Carnaval?
– Agora, eu no seu lugar... Se anima, Ternura! Você vai passar o Carnaval na p-r-a-i-a. Beach!
Gláucia estava estranha mesmo. Nunca ficara tão desinteressada com uma viagem. Esforçou-se para reagir:
– Credo, amiga! – Andréa, supersticiosamente, bateu três vezes no birô. – Isola, hen? Vira esta boca pra lá!
No noticiário da televisão no sábado meio-dia, ouvia-se:
2005
Este conto reúne duas dores que me marcaram profundamente:
ResponderExcluir1 - A morte repentina da minha amiga de infância e confidente, Glaúcia Rodrigues, aos 19 anos, em 24/01/1997, com aneurisma. Naquela manhã de sábado, quando atendi o telefone antes de sair para o trabalho e a prima dela deu a notícia achei que era trote. Ternura costumava pregar essas peças na gente. Durante muitos meses a minha ficha não caiu... Às vezes, eu me flagrava com pensamentos do tipo "tenho que pedir a opinião de Ternura sobre isso". Até hoje não suporto ouvir a música "Um dia frio" do Djavan que fazia sucesso naquela época.
2 - O acidente grave que sofri em Limoeiro do Norte (CE) na madrugada de 04/03/2000, sábado de Carnaval, quando seguíamos numa excursão para Fortaleza (CE). Morreram quatro pessoas na hora, algumas se feriram e eu não levei nem arranhão. Tenho perguntas sem resposta para minha não-morte até hoje. Por quê? Pra quê?
GRATA PELA VISITA!