PANAPLÉIA

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Bem-vindo(a) ao Laboratório de Autoria de Panapléia! À esquerda das postagens, estão meus textos divididos em categorias e temas. À direita, indicações de blogs e as mídias sociais. No rodapé, mimos felinos e os créditos do blog. Boa leitura!

EUSCRITORA: DOS 02 AOS 10 ANOS

Por esses dias estive preparando um Curso de Incentivo à Leitura e coletei muitos depoimentos de amigos escritores. Procurei os autores que conheço e perguntei: qual obra foi seu primeiro amor? Recebi respostas incríveis – das mais banais as mais bizarras. Enviaram-me também textos longos sobre a descoberta da vocação de escritor. Fiquei com uma pulguinha atrás da orelha: e você, Paula Izabela, quando vai confessar seu primeiro amor? Quando vai admitir que alimentou o sonho de escrever? Bem, senhoras e senhores, sem poupar detalhes, vamos aos fatos...

Valdemiro, Paula Izabela e Terezinha – 1981.
1980:

Aos 02 anos, não queria brincar de bonecas. Culpa da minha mãe que não me deixava sujá-las, nem desmontá-las, essas coisas que criança precisa. Minhas bonecas tinham uma missão muito importante – estarem sempre lindas e imóveis me olhando. Na falta de algo melhor para fazer, eu pegava uma caneta e saia rabiscando todos os papéis que encontrasse pela casa. Ainda hoje tenho aqui um álbum de fotografias rabiscados por círculos vermelhos.

1981: 

Não tínhamos livros, mas meus irmãos iam à escola. Por alguma razão que desconheço, eu queria ir também. Meus pais explicavam que eu não tinha idade e minha ladainha era: “quando eu crescer, eu vou estudar, se Deus quiser”.

1982: 

Fui parar numa sala de maternalzinho de uma escola de fundo de quintal porque morávamos num bairro afastado do centro. Minhas tias paternas achavam um crime eu ir à escola naquela idade, mas minha mãe se rendeu aos meus apelos. Naquela época – na Renascença – havia a crendice que criança que vai muito cedo à escola ou estuda muito pode enlouquecer. Bem... Eu seria louca de qualquer jeito, mas ninguém havia percebido isso ainda.

1983: 

Um anjinho soprou no ouvido dos meus pais para comprarem uma coleção de contos de fadas, livros vermelhos, capa dura, editora Gamma, vendidos nas portas. Benditos vendedores de livros! Ainda hoje os guardo como um tesouro: Branca de Neve, Cinderela, Peter Pan e Soldadinho de Chumbo. Eles têm uma gravura colorida na capa (que se mexe quando movemos o livro – isso era o máximo da modernidade) e vinham acompanhados do disco, mas nós não tínhamos radiola. (Meu Deus, o word não reconhece a palavra radiola. Estou tão velha assim?) Minha mãe cansou de lê-los para mim, meu pai e meus irmãos nem chegavam perto. E agora? Bem, problemas desesperados exigem medidas desesperadas – naquele tempo eu já havia percebido isso. Colocava o livro da Branca de Neve, meu preferido, embaixo do braço e importunava as visitas com aquele ar de criança de rua que pede dez centavos: “Lê para mim.” Felizmente, família grande de ambos os lados, eram muitas visitas. Meus primos me ignoravam, mas as primas mais velhas passavam horas lendo a coleção para mim. Esqueci de explicar o porquê da Branca de Neve. Pela associação: eu era branquinha, cabelos muito pretos... e queria ser a mais bela. Lembro muito bem de uma tarde, sentadas no sofá da sala, Anizete – minha prima materna mais velha – tropeçou numa palavra da Branca de Neve e eu corrigi. Ela me olhou estupefada: “Tu não disse que não sabe ler?” “E não sei, mas já decorei a história.” “Qual é a graça de se ouvir uma história que você sabe decorada?” “Não sei, mas só tenho esses livros.” Bem, naquela época eu já dava indícios do caminho que pretendia seguir.

1984: 

Com a morte da minha avó paterna nos mudamos para o centro e fui transferida para a Escolinha Chapeuzinho Vermelho. Ainda não sabia ler, o que deixava minha mãe preocupada. “Tanto tempo na escola e as professoras não ensinam que preste.” Minha mãe pagou uma adolescente da vizinhança e aulas de reforço para eu aprender a ler. A adolescente brincava de escolinha comigo e nas aulas de reforço as outras crianças sabiam menos do que eu. Insistente, minha mãe comprou um pequeno quadro negro e fixou na cozinha – perto da geladeira. Ensinou-me a ler entre uma tarefa doméstica e outra. Eu ficava tão ansiosa com o processo de aprendizagem que pulava feito um carneirinho – considerando o meu tamanho, acho que pulava igualzinho uma pulga. Um dia minha mãe lançou o desafio: pulo. “Vai ter que ler essa aí sozinha.” Lembro-me desse desafio até hoje. Como fiquei aflita e como pulei, pulei, pulei. Até que disparei o míssil: “Pulo!” Pulei mais ainda e mais ainda por ter lido uma palavra sozinha. Alguma mola propulsora embaixo dos meus pés deve ter acelerado o processo de aprendizagem. No mesmo dia, já lia dissílabos e trissílabos sozinha. Adoraria saber esta data, pena que mamãe não anotou.

Acervo pessoal. Foto: Paula Izabela.
1985: 

Como aprendi a ler nas férias, pude pular do Jardim I para o III, até porque minha idade já estava ficando fora de faixa etária para o Jardim II. Foi quando apareceu um vendedor na escola e convenci minha mãe a comprar um livro datilografado e mimeografado, com desenhos feitos a mão. É um dos tesouros da minha biblioteca. O Cavalinho Branco foi meu companheiro inseparável para colorir, ler e decorar. 

1986: 

Nesse ano, fui cursar a 1ª série no Colégio Batista e ganhei um livrinho de orações evangélicas. Fiquei muito feliz porque elas vinham separadas por dias da semana, todo dia teria minha leitura obrigatória. Para minha tristeza, mamãe proibiu a leitura, rasgando o livrinho e jogando-o no lixo. Lembro que chorei por horas pela injustiça que sofri. Hoje sorrio do ridículo da situação: eu só queria ler e ela achava que eu estava mudando de religião.

1987: 

Meu pai, feirante, comprava papel por quilo e também recebia doações. Eu achava criminoso desfolhar aqueles livros, revistas e jornais para enrolar sabão em barra. Antecedi a menina que roubava livros mexendo no depósito escondido, comecei a salvar os papéis da desonra levando-os para um quartinho cheio de tralhas – hoje o banheiro do meu quarto. Eles ficavam salvos do meu pai, mas não das baratinhas que eu enfrentava corajosamente cada vez que ia buscá-los. Quando minha mãe os descobria, devolvia tudo para meu pai, surda aos meus protestos e lágrimas de frustração. Ela não era má ou contra minhas leituras, era e é contra alimentar baratinhas com papel velho. Quando os sabões em barra começaram a vir enrolados num plástico fininho meu pai deixou de comprar papel velho para minha decepção. A salvação era esperar minha mãe trazer as compras do mercado e aventurar alguma comprinha enrolada em papel jornal. Estes sempre desapareciam subitamente de onde ela os guardava para limpar espelhos e vidros.

1988:

Ao ser convidada para
recitar Cajueiro Pequenino do Juvenal Galeno no aniversário do diretor do Colégio Batista fiz a grande descoberta – eu queria ser a Cecília Meireles (apenas). Peguei um álbum de figurinhas da Turma da Mônica e imaginei qual história eu escreveria aproveitando aquelas ilustrações – era algo associado a crianças que eram escravizadas num circo. Ideia articulada e rascunhada procurei Rose – minha vizinha que por ser mais velha sempre tinha resposta para tudo – para me explicar o que eu precisava fazer para publicar. Pacientemente ela explicou todo o processo, conclui que definitivamente não conseguiria. Fiquei tão decepcionada que joguei o rascunho fora, pelo menos guardei o álbum que conservo com carinho até hoje.

Escrivaninha de Paula Izabela – presente pelo
meu aniversário de 09 anos – mamãe ao canto.
| 2008 |

2 comentários:

  1. Deusidências da vida, quando eu estava procurando as fotos para essa postagem Anizete chegou aqui com os filhos. Ela mora em S. Luís (MA) há vinte anos e perdemos um pouco o contato. Primeira coisa que minha prima pediu quando entrou em minha casa? Exatamente! "Cadê a coleção dos Contos de Fadas?" Para os curiosos de plantão é essa coleção vermelha/preta que aparece aí na escrivaninha da foto.

    OBRIGADA PELA SUA VISITA!

    ResponderExcluir
  2. Paula,linda as histórias de sua vida,muito bom ter lembranças assim...Você escreve divinamente bem!E olhe,acho que já lhe disse,mas estudei com vc no Batista justamente nessas séries 1º e 2º série.Era muito sua amiguinha! Parabéns, vc faz textos que dá vontade de ler,e ler mais e mais!Sim fui sorteada com o livro.ADOREI! Ana Paula Costa Moreira

    ResponderExcluir

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